Ao
som de mantras, a professora fecha as cortinas e reduz a iluminação
dentro da sala. No chão, eles relaxam em colchonetes dispostos um ao
lado do outro. Poderia ser uma aula de ioga em qualquer estúdio
especializado, mas os alunos têm cerca de 3 anos e a prática acontece em
uma creche conveniada à rede municipal de ensino de São Paulo.
Turma
de alunos do CEI (Centro de Educação Infantil) Lar de Crianças Ananda
Marga durante a aula de ioga, que acontece uma vez por semana. A prática
faz parte de uma série de atividades que buscam desenvolver aspectos
físicos e emocionais. A creche fica no Jardim Peri, zona norte de São
Paulo, e atende 111 crianças de zero a 3 anos Imagem: Leonardo Soares/UOL
O CEI (Centro de Educação Infantil) Lar de Crianças Ananda Marga,
administrado pela ONG Amurt-Amurtel, está localizada no Jardim Peri,
zona norte de SP, em uma área cercada por favelas. "Vemos muitos casos
de violência doméstica e de pais que estão presos, então a creche
precisa ser um espaço de acolhimento para essas crianças", afirma a
diretora Silvia Helena de Oliveira.
Para se adaptar aos pequenos
iogues, as duas professoras contam histórias para ensinar as posturas
para a turma de oito alunos. A aula começa com um "passeio na nuvem",
em seguida, o grupo faz a saudação ao sol (uma das sequencias mais
conhecidas da ioga), passa para uma série de posturas e, então, fecha os
olhos para o relaxamento.
Em uma das últimas etapas da aula, as
crianças fazem massagens no rosto, nos braços e nos pés dos colegas. A
prática, realizada uma vez por semana em cada turma, é utilizada para
desenvolver a parte física e emocional dos alunos.
"O objetivo é
estimular a criatividade, a autoestima, o desenvolvimento do caráter
dessas crianças", explica Didi Ananda Jaya, coordenadora de projetos da
Amurt-Amurtel em São Paulo. A ONG adota a filosofia neo-humanista, que,
segundo a instituição, busca a transformação do indivíduo em um ser mais
saudável, solidário, ativo, compassivo e consciente do seu papel na
sociedade.
A hora do toque
Enquanto os mais velhos
praticam ioga, o berçário é preparado para a shantala, uma massagem
indiana para bebês. A iluminação é reduzida e as professoras ficam em
silêncio: a aula será apenas pelo toque, e a sala é invadida pelo cheiro
do óleo de essência lavanda.
O bebê deita sobre as pernas da
professora, que tira a sua roupa e começa a massagem. No início agitado,
ele vai aos poucos relaxando e sente o toque nos braços, em cada um dos
dedos das mãos, nas pernas, nos pés, nas costas... E então começa a
dormir.
Todas as crianças do berçário recebem a massagem uma vez por semana. A
ideia, dizem os professores, é fazer com que se sintam acolhidos na sala
de aula e tenham um momento de carinho no ambiente em que ficam durante
boa parte do dia. A técnica também é ensinada para as mães.
"Até os 3 anos, eles estão começando a viver a sua personalidade, as
relações interpessoais, as relações familiares, então é importante que
encontrem acolhimento no ambiente escolar para brincar, cantar, correr,
pular e para todos os tipos de expressão", afirma a professora e
pesquisadora da Faculdade de Educação da USP, Maria Letícia Nascimento.
Boas-vindas
No início de cada aula, eles se reúnem para o "círculo do amor", um
momento "zen" de boas-vindas antes do café da manhã. Eles cantam, batem
palmas, fazem saudações ao sol, à natureza e agradecem pela presença dos
colegas. Nas paredes da sala, estão desenhos, fotos e atividades sobre
família, a casa e o bairro em que os alunos moram.
A unidade
atende 111 crianças com até 3 anos e 11 meses, que ficam na creche em
período integral. São, em média, 45 vagas abertas por ano na unidade e é
a prefeitura quem faz distribuição delas.
"O ideal seria que em
todas as creches as crianças tivessem a oportunidade de se expressar,
de falar da família, da sua casa e do que fez no final de semana", diz a
professora da USP, que é especialista em educação infantil.
Além das práticas, a alimentação no CEI Ananda Marga é vegetariana,
repleta de frutas e verduras, e feita sob a orientação de um
nutricionista da ONG e outro profissional da Prefeitura de São Paulo.
Outras três creches administradas pela ONG pertencem à rede municipal
de ensino e adotam a mesma linha pedagógica. Elas funcionam na zona
norte e na zona sul de São Paulo.
Em abril deste ano, cerca de 110 mil crianças esperavam por uma vaga em creches da cidade.
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