sábado, 19 de abril de 2014

POR QUE ENGOLIR UM SAPO ??


Há pessoas que engolem sapos por medo. Bem que seria possível evitar a repulsiva refeição : o sapo é um sapinho. Mas elas preferem engolir o sapo a enfrentá-lo. Não têm coragem de pegá-lo e jogá-lo contra a parede. Pessoas que fizeram do ato de engolir sapos um hábito, acabam por ficar parecidas com eles : andam aos pulos, sempre rente ao chão e coaxam monotonamente.

Mas há situações em que é inevitável engolir o sapo. Eu mesmo já engoli muitos sapos e disto não me envergonho. O meu desejo, com esta crônica, é dar uma contribuição ao saber psicanalítico, que até agora fez silêncio sobre o assunto. Muitos dos sintomas neuróticos que afligem as pessoas, resultam de sapos engolidos e não digeridos.

Tudo começa com um encontro : à minha frente um sapo enorme, ameaçador, com boca grande. A prudência me diz que é melhor engolir o sapo a ser engolido por ele. É melhor ter um sapo dentro do estômago (sapos engolidos nunca vão além do estômago) do que estar no estômago do sapo.

Aí, impotente e sem opções, deixo que ele entre na minha boca, aquela massa mole o nojenta. É muito ruim. O estômago protesta, ameaça vomitar. Explico-lhe as razões. Ele cessa os seus protestos, resignado ao inevitável. Não consigo mastigar o sapo. Seria muito pior. Engulo. Ele escorrega e cai no estômago.

Alimentos não digeríveis são eliminados pelo aparelho digestivo de duas formas : ou são expelidos pelo vômito ou são expelidos pela diarreia. Os sapos são uma exceção. Não são digeridos, mão não são expelidos nem pelas vias aéreas superiores nem pelas vias inferiores. Os sapos se alojam no estômago. Transformam-no em morada. Ficam lá dentro. Por vezes hibernam. Mas logo acordam e começam a mexer.

Ninguém engole sapo de livre vontade. Engole porque não tem outro jeito. Tem sempre alguém que nos obriga a engolir o sapo, à força. A pessoa que nos obriga a engolir o sapo, a gente nunca mais esquece. Diz a Adélia Prado que "aquilo que a memória amou fica eterno".
Aí eu acrescento algo que aprendi no Grande sertão. Conversa de jagunços matadores. Diz um : "Mato, mas nunca fico com raiva". Retruca o outro, espantado: "Mas como?. Explica o primeiro : "Quem fica com raiva, leva o outro para a cama". É isso. A gente leva para a cama pessoa que nos obrigou a engolir o sapo.

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RUBEM ALVES...MEU POETA PREFERIDO
integracaoholistica.blogspot.com

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