O bater do tambor; o sopro da flauta, o toque do sino e do gongo. Em cada ritual, os instrumentos musicais abrem portas para a elevação da consciência.
Corpo, mente e espírito se revigoram com esses sons celestiais.
A música toca o coração de diversas formas, trazendo alegria, tristeza, melancolia, euforia. E essa força transformadora se amplifica por meio dos instrumentos sagrados, presentes nos rituais religiosos desde tempos remotos.
Esses sons, sim, têm poder. Batidas de tambores e toque de gongos, repetidos sucessivamente, elevam o espírito e conduzem o ouvinte a estágios alterados de consciência, como transes e estados meditativos.
Ao apaziguar, promovem o bem-estar físico e mental. Esse conhecimento já era compartilhado pelos xamãs, uma mistura de sacerdote, feiticeiro e adivinho que curava e afastava os maus espíritos usando a música.
Os antigos reconheciam nos sons remédios para os males do corpo e da alma. Há cerca de 2,5 mil anos, o filósofo grego Platão proclamava seus efeitos terapêuticos, frisando a virtude deles ao aprimorar o caráter, a saúde e o raciocínio. No âmbito do sagrado, esse vigor é ainda maior. O som do instrumento ritualístico faz parte de uma experiência coletiva, enraizada no imaginário dos povos. Embora cada ouvinte reaja de maneira particular, as vibrações unem os indivíduos em sua essência mais primitiva, além do intelecto.
Nesses objetos, formatos, materiais e jeitos de serem manipulados contribuem para um tipo de efeito em nível inconsciente. “Como os sinos das igrejas, que, segundo o toque, agregam ou dispensam os fiéis”, explica a musicoterapeuta Ana Carla Estevez Balthazar.
Diferente da música linear, em que acordes se encadeiam formando a melodia, os sons sacros são longos repetitivos e retomam a nota fundamental. Por isto, ajudam a mente a se desligar do mundo externo.
CONHEÇA A SEGUIR INSTRUMENTOS SAGRADOS DE VÁRIAS DOUTRINAS:
NA BATIDA DO TAMBOR, A VIAGEM DO XAMÃ
No xamanismo, um conjunto de crenças originado há milhares de anos, centrado na figura do xamã, o toque do tambor representa o pulsar do coração da Mãe Terra, um som primordial que reverbera no inconsciente de cada pessoa. “Esse instrumento é o meio de transporte dos iniciados para outros níveis de consciência por meio do qual são feitas as viagens de autoconhecimento e cura”, explica Vânia Vorveloni, terapeuta do Paz Geia Instituto de Pesquisas Xamânicas, de SP. “Por isso, chamamos o tambor de cavalo do xamã”, completa Carminha Levy, psicóloga e fundadora do instituto.
Feitos de madeira e pele, os tambores provocam alterações no sistema nervoso e conduzem ao transe, de acordo com o toque. “O som ativa uma região cerebral que guarda nossas memórias ancestrais e os arquétipos, imagens psíquicas compartilhadas por toda a humanidade”, salienta Carminha Levy.
Nas viagens conduzidas ao som do tambor, a expansão da percepção e da sensibilidade traz sensação de apaziguamento e bem-estar e, alguns acreditam, atenua até males físicos.
Cada instrumento é confeccionado especialmente pelo xamã. O couro, a madeira, as penas usadas como enfeites, tudo é escolhido segundo a instuição e consagrado em rituais e preces, conta Vânia Corveloni. O resultado é sempre único, inclusive em termos de sonoridade. “Às vezes, faço dois tambores do mesmo tamanho e material, e os timbres resultam completamente diferentes”, afirma.
Nos rituais, os xamãs batem o tambor não apenas com a baqueta mas também com o maracá, outro instrumento com funções mágicas.
“Além de afastar a negatividade, o som do chocalho reúne pedacinhos de nossa alma que ficam perdidos no dia-a-dia, em meio a mágoas, traumas e doenças”, diz a terapeuta.
O GONGO CHINÊS CONVOCA OS SERES ILUMINADOS
Chamado de TA TCHING, o gongo de metal é um isntrumento central do cerimonial do budismo chinês – essa religião, de origem indiana, fundada pelos seguidores de BUDA, chegou à China mais de 2 mil anos atrás. Em formato de uma grande tigela, é bem diferente do disco metálico popularmente conhecido por gongo chinês, presente inclusive em orquestras sinfônicas.
Para bate-lo, usa-se um bastão de madeira e borracha.
O toque do ta tching assinala o início das cerimônias budistas. “São geralmente três batidas, e a cada uma delas acende-se um incenso”, conta o mestre Hui Hou, do Templo Zu Lai, de Cotia, em SP, orientador pedagógico da universidade local.
Esse som profundo e solene, segundo Hui Hou, “comove e pacifica o espírito de quem o escuta”. E também convida os seres celestiais, como os budas e bodisatvas, a se reunir e participar dos cultos. Eles, por sua vez, têm diversas finalidades no cotidiano dos templos e centros budistas: homenagear e atrair bênçãos de seres iluminados, fazer oferendas e celebrar o amor, a compaixão e o arrrependimento, que estão nos fundamentos da filosofia. “Nessas ocasiões, tocar o instrumento representa uma enorme responsabilidade, reservada apenas ao religioso que vai conduzir o ritual”, completa Hui Hou.
JACUÍ, O SOPRO MÁGICO INDÍGENA
“Flautas, maracás e tambores são usados nos rituais tanto para exorcizar espíritos malignos como para curar doenças e atrair a proteção para a aldeia”, explica o artista plástico Walde-Mar, pesquisador e coordenador do Centro de Informação da Cultura Indígena (Cici), de Embu das Artes, em São Paulo.
Entre esses objetos mágicos, o jacuí aparece como o traço comum entre os grandes grupos étnicos da região do Alto Xingu – Aruaque, Karib e Tupi, no Mato Grosso.
A flauta, feita de madeira, com duas partes unidas com cera de abelha e embira (a casca de um cipó chamado embé), tem a faculdade de evocar proteção e boas energias para a tribo. Seu sopro acorda os bons espíritos que habitam o fundo dos rios, onde as flautas recém-confeccionadas têm de descansar para então serem vedadas com cera. “Nos rituais, antes de tocado, o jacuí recebe sempre um banho de água limpa”, lembra Walde-Mar.
Como usar a flauta é privilégio masculino, ela deve ficar bem escondida, embalada em esteiras de palha, na oca do dono. Ou então ser guardada na habitação coletiva que abriga os jovens solteiros. As índias podem ouvir o sopro do jacuí, mas nunca ver o isntrumento, segundo Walde-Mar. “Uma mulher flagrada olhando para ele costuma ser severamente castigada”, conta o estudioso.
Diz a lenda que em tempos míticos, os homens roubaram das mulheres os instrumentos musicais, símbolos de poder. A partir daí elas foram condenadas a participar também dos trabalhos pesados da aldeia, como fazer as colheitas e carregar a lenha.
SINOS TIBETANOS CURAM E APAZIGUAM
Repletos de símbolos, os instrumentos musicais são objetos ritualísticos de vital importância no budismo do Tibete, outra vertente da religião nascida na inda com base nos ensinamentos de Buda. Sinos, tambores e chocalhos, feitos de ligas de metal (especialmente bronze), desempenham funções distintas nos ritos.
“Cada som canaliza um tipo de energia sutil. Por isso, os instrumentos são usados de formas diferentes em bênçãos, festas e cerimônias fúnebres, limpando o ambiente ou evocando os seres espirituais”, conta o lama Karma Zopa Norbu, fundador do centro de estudos e práticas budistas Jardim do Dharma, em SP.
Acredita-se que muitos desses instrumentos são tão antigos quanto o próprio budismo. Alguns servem especificamente para invocar entidades masculinas (caso do tambor damaru) e outros apenas as femininas (como os sinos), segundo o lama.
O milenar conhecimento do poder dos sons também é explorado com fins terapêuticos. Ao mexer profundamente com o corpo e a mente, as vibrações de sinos e címbalos, por exemplo, estimulam a meditação e trazem o bem-estar. Sozinhos ou em conjunto com exercícios e vocalização de mantras, ajudam a aliviar tensão, depressão, fobias e medos.
“Ouvi-los acalma e induz ao relaxamento profundo”, diz Zopa Norbu.
Pesquisas mostram que esses sons diminuem até o nível da pressão sanguínea. Em algumas terapias, tais objetos são colocados diretamente sobre a pessoa a fim de alinhar os chacras (os centros de energia do corpo, segundo as filosofias orientais).
Postado por : Ana Lúcia - integracaoholistica.blogspot.com
Fonte : Revista Bons fluídos
Imagem : Google
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